sábado, abril 05, 2008

A força de uma vida

No mesmo hospital, em menos de um mês, outro caso de maus-tratos. Está internada uma menina de quatro anos, que pesa apenas sete, sendo que o ideal seriam 16 quilos. A criança foi internada com diárréia e vômitos, e não se alimenta pela via oral, apenas por intermédio de uma sonda. Os pais, alcoólatras, não a alimentavam, e impediam qualquer um de chegar perto. Depois de uma denúncia, quando o conselho tutelar entrou na casa, a menina estava toda suja, e não conseguia mais chorar, apenas grunia.

Nunca iriam escutá-la. Os pais saiam e deixavam o som em alto volume. Outro detalhe: A menina nunca mais vai ter condições de andar, e está com o seu desenvolvimento comprometido. E não tem com quem ficar. Que futuro podem ter? Não seria melhor desistir? Não seria mais fácil? Mais do que o próprio exercício diário de sobrevivência, estas crianças já nascem levando "porrada" da vida. Infelizmente aprendem na marra, motivada pela irresponsabilidade, e loucura de quem deveria ter a obrigação, não apenas de cuidar, mas de educar.
Estas crianças podem nos instigar muito mais do que o sentimento de revolta. Elas ensinam o que a maioria das pessoas aprendem, muitas vezes, depois de adulto. Que a realidade não é justa. E que chega em um momento em que se deve aprender a andar sozinho.O fato destas crianças continuarem a respirar ensina que a luta deve ser diária. Se elas, que não possuem condições de se defenderem da loucura do mundo, continuam. Porque deveríamos desistir?
Quando se chega perto do palco, os defeitos ficam mais visíveis. Os predestinados a vencer, muitas vezes, se incomodam diante da vida, sempre acostumados a serem servidos. E pensam, muitas vezes, que o destino o escolheu como o novo predestinado. Assumem assim uma posição de arrogância, e de menosprezo em relação à vida. Tudo, para eles, se torna banal. Mal sabem que existem pessoas, que de tantas dores, sofrem com o mínimo sinal de respiração, e que as batidas do coração se elevam a cada movimento. Apenas a procurar a felicidade onde elas podem alcançar: a própria vida.
Foto: Luís Tito - Agência A Tarde