quinta-feira, dezembro 06, 2007

Curtas do blog - Quanta mudança

E quem disse que mudar é ruim? A verdade é que depois que me mudei, quase não parei em Barreiras. Para quê parar, não é? Ainda estou me adaptando. Se bem que este mês de dezembro será um mês estranho. É aquele clima de natal, misturado com fim do ano, e no final das contas, todo o mundo enrola e joga tudo para o próximo ano. Vou fazer isto também. Vou deixar para me acostumar em 2008.

Apesar de ter crescido em Barreiras, e vivido aqui por longos 17 anos, a verdade é que não conheço mais nada. Tirando os buracos e o calor que aumentaram. Não reconheço mais ninguém na rua. Não sei onde fica mais nada. E também não tenho vontade de fazer nada. Só tô a fim mesmo de trabalhar. eeheeeeheheheheh. Quem vê pensa. Mas é verdade galera.

Ao sair de Barreiras, fui para Goiânia para ir direto em São Paulo. Com a minha mochila vermelha nas costas, sai de Congonhas e fui para a referência: "Como faço para ir para a paulista?" De lá, fui de metrô ate o hostell, na São João.

- Eu gostaria de um quarto?
- Tá R$ 68, senhor.
- Isto tudo? Pensei que fosse mais barato (respondendo à atendente, pensando em uma alternativa viável).
- o sr. tem carteirinha de alberguista?
- Não tenho.
- Tem os quartos coletivos, sr.
- Quanto está? R$ 36.
- Como é que é?
- Normal. são quatro camas. Só que entra e sai os hospedes que vão acompanhar no quarto (não perguntei se teria perigo. Achei que ela fosse me achar muito do interior)
- Me dá este então ( e pensando "Seja o que Deus quiser)

Depois no msn com o Eduardo Sartorato
- Mas você não perde a sua privacidade?
- Pois é Eduardo. Nesta hora eu percebi que com privacidade é mais caro.

No final precisei usar o meu inglês para conversar com os colegas de quarto, Tom (inglês de Lonfres) e Graham (Irlanda). Uma comédia o meu inglês. Eu não entenderia. mas eles fizeram um esforço. Foram bastante compreensivos. Eu também. Saímos no sábado. Fomos com o Fellipe e com a Lorena em uma danceteria na Vila Madalena. Perfeito!!

No domingo pela manhã, fui de cara fechada para o café da manhã. Tava com uma dor de estomago e uma ressaca. Não comi pão. Fiquei na gelatina, goiabada, e leite com toddy. Aproveitei a minha cara fechada para não falar com seu ninguém. Também perdi o show da Diana Krall e o meu voo. Isto é uma outra história. Não aguentava mais falar inglês. No máximo um hello.. good morning. Segundos depois precisei me despedir em inglês. Ótima experiência.

Planos para restante de 2007:
- entrar na academia;
- tirar carteira de motorista;
- voltar à minha leitura de livros;
- assistir muito DVD;
- passar o natal e o ano-novo com a família;

segunda-feira, dezembro 03, 2007

Sou o que sou

Isto é muito comum. Em algum momento, de repente, vem aquela pergunta. Passam dois segundos, não aparece nenhuma resposta; nem clara, muito menos concisa. Lembro bem, enquanto tirava a roupa da máquina, na apertada área de serviço, apareceu novamente o questionamento. Quais as atitudes e comportamentos que a gente precisa ter, dependendo do local e das pessoas.

Pode ser que isto possa ser comparado a uma espécie de etiqueta ou moral. Ou outra coisa que valha. Certos arquétipos, ou modelos, que devem ser seguidos. Tudo como as pessoas acreditam que devem fazer para se sentirem aceitas, seja no trabalho, em uma festa, no shopping, pelos amigos, colegas de trabalho e, até mesmo, desconhecidos.

Por exemplo, gostaria de ser considerado competente. Só que não basta ser. Muitas vezes é preciso parecer. Talvez se eu fosse com uma calça de brim, cinto preto, combinando com o sapato, camisa social, e com os cabelos bem cortados. E claro, não fazer piadinhas no trabalho, conversar o mínimo possível, e ter postura sempre ereta. Quando alguém fizer uma piada, rir apenas no canto da boca, consentindo a brincadeira, mas que de pronto informa. “Esta não é a hora correta”.

Ao mesmo tempo, em uma mesa de bar, fazer as pessoas sentirem próximas, e bem por estarem perto. As roupas podem ser aquela calça jeans rasgada no joelho, camiseta velha, tênis e aqueles cabelos, que de longe, parecem fugir dos cabeleireiros. Não importa. Ali, as atenções estão voltadas para que as pessoas se sintam bem. Muitos sorrisos, as cabeças se mexem, as brincadeiras parecem, à cada momento, mostrar atenção por estarem ali.

Impossível ser dois ao mesmo tempo. Acho que já fiz a minha escolha, anteriormente, ao persistir em não usar óculos, gostar de música baiana, fazer brincadeiras indiscretas, ou tentar sorrir nos mais variados momentos. Em qual momento fiz esta escolha? Não sei. Talvez eu ainda mude, aprenda outras coisas, mas prefiro continuar a andar sem saber estes pormenores na psiquê nada fácil de ser entendida. Paciência então. Continuo a estender as roupas. E quer saber? Depois eu penso nisto. Prefiro olhar a sacada os prédios, e a luz deste sábado de manhã.

Redescobri

Cobri minha vida de surpresa
Cobri quem está ao meu lado de companheirismo
Cobri a alma de insatisfação e angústia
Cobri as tristezas com o esquecimento
Cobri tudo que não queria ver

Descobri, ou melhor, redescobri neste último mês que é bom mudar
Descobri que às vezes é importante deixar tudo de lado para priorizar a vida
Descobri que devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance. Se o destino não ajuda, não há o que fazer, senão aceitar
Descobri que sou mais do que dizem
Descobri que sou melhor do que penso ser

(Re) descobri que saudade dói muito
(Re) descobri o quanto é bom estar em casa
(Re) descobri o quanto é bom se preocuparem com você
(Re) descobri o quanto faz bem se sentir amado
(Re) descobri o quanto faz bem amar

terça-feira, novembro 06, 2007

O início da continuação

A imagem, aos poucos, começa a congelar no tempo e no espaço. Lembrar daqueles tempos não me faz nada feliz. Sei disto. Preferi esquecê-los ou deixar guardados. Bem longe, em uma espécie de gaveta de esquecimento da memória. Pensando melhor. Aqueles tempos deixaram-me mais forte.

Não seria mais uma pequena colisão que me derrubaria. Deveria ser uma trombada. Aprendi em todo este tempo a não perder tempo, principalmente com aqueles que nada podem oferecer. Talvez este o motivo da reclusão. Ao mesmo tempo uma desculpa para sempre que possível estar rodeado dos amigos.

Como encarar tudo novamente então? Aqueles tempos se foram. Não existem mais. Aquilo ficou na memória. Na época, nem me preocupei em olhar tudo pela última vez. Só fui embora. Sem olhar para trás, e de uma forma sádica, com um sorriso no rosto. Não havia necessidade de lembrar de nada. O tempo e o espaço, e principalmente, eu, foram se transformando. Aqui estou eu, novamente, pronto encarar aquilo tudo novamente. Talvez o maior de todos os desafios.

Nesta nova mudança, tento olhar tudo pela última vez. O agito das ruas, o sabor de um fast-food, os olhares amigos, a expressão indiferente, gostaria de prender tudo ao mesmo tempo na memória. Algo me diz isto ser desnecessário, tanto que o espírito parece querer desobedecer a mente. Mesmo com o desejo, nada fica gravado como se fosse a última vez.

O que significa voltar? Não acredito que seja uma volta. Infelizmente ainda não estou preparado para encarar assim. Será uma continuação da minha vida. O início de uma continuação. Se assim posso dizer. Sem as responsabilidades de encarar o passado. Quero viver da forma como eu sempre vivi. Nem intensamente, nem apaticamente. Só de um jeito diferente. Apenas do meu jeito.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Machado blogueiro?!

"13 de julho
Sete dias sem uma nota, um fato, uma reflexão; posso dizer oito dias, porque também hoje não tenho que apontar aqui. Escrevo isto só para não perder longamente o costume. Não é um mau este costume de escrever o que se pensa e o que se vê, e dizer isso mesmo quando não se vê nem pensa nada".
(Machado de Assis, no trecho do livro Memorial de Aires)

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Um dos últimos romances de Machado de Assis, publicado em 1908, Memorial de Aires demonstra que o autor já vislumbrava a linguagem autobiográfica dos blogs, inclusive com as reflexões metalingüísticas acerca das técnicas de escrevinhar. Sempre à frente do seu tempo, Machado escreve em forma de diário de bordo, como qualquer um de nós, que se empolga, cansa, viaja, descreve, reflete, inspira, ou mesmo, como no trecho acima, fica dias sem inspiração, e escreve apenas para preencher o papel.

Ao narrar a vida da família Aguiar, e principalmente de Fidélia, Conselheiro Aires também descrevia a sua vida, e as suas muitas reminiscências quando voltou a morar no Rio de Janeiro, depois de longa jornada como diplomata em Portugal. Ao mesmo tempo, Machado (ou o próprio Conselheiro) criticava a sociedade da época, sempre com a sua fina ironia. Machado, por meio do Conselheiro Aires, pode ser considerado o mestre dos blogueiros, por quê não?

Trilha: Memorial de Aires, de Machado de Assis (1908)

quarta-feira, outubro 03, 2007

Template novo

Devido à problemas técnicos, houve uma mudança do template. Quando for sanado o problema, volto com o visual antigo.
Com a mudança, o humor do dono, que passa por uma pequena gripe, também mudou. E nos próximos dias, terá uma nova postagem, de um texto novinho em folha. Por enquanto fica somente a mensagem.
"A vingança nunca é plena, mata a alma e envenena"... Chavez, não do Hugo, mas do seriado mexicano.
Abraço a todos

quarta-feira, agosto 29, 2007

Alguém poderia me emprestar um cigarro?

segunda-feira, agosto 27, 2007

Escreva sem pensar... muito...

Já decidi não postar os comentários do tipo: “Até que enfim postou, né?” ou então “Atualiza... Atualiza...”. Blog é algo autoral. A gente posta na hora que dá vontade. Lembro que até escrevi um texto sobre o porquê de postar, intitulado “Reflexões de um sonolento”, que começava assim: “Amanhã eu preciso tirar este post horrível que está embaixo. Não que tenha ficado tão medonho e horrendo assim,mas porque não agüento mais vê-lo. Só é um incômodo. Mas então, o que escrever? Vamos pensar!!!”

Quando este blog foi criado, há exatamente no dia 08 de agosto, a idéia era montar algumas pequenas narrativas, de curtas viagens. Eram nas trilhas, naqueles trechos que enriquecem a alma e o coração, que eu gostaria de dividir com quem lesse o “Andarilho”. Poderia ser São Paulo, Brasília, Barreiras. Eu queria entrar em contato com um alguém, há muito tempo distante. Este era eu, perdido nos caminhos da Facomb [Faculdade de Comunicação e Bibliotecnomia da UFG], sem eira, nem beira, e o pior de tudo, sem saber que estava nesta condição.

Nunca fui ligado a crises existenciais. Confesso que sempre curava, e ainda curo, as minhas angústias de outras formas. Ou eu ia ao cinema, ia dormir, conversava potoca com os meus amigos. Talvez eu tentava jogava os problemas (os poucos que eu tenho, e tinha...) para debaixo do tapete. Podia ser. Mas também poderia ser uma forma de lidar com as angústias, que em suma todo o mundo tem.

Apesar de nunca contar algo diretamente sobre a minha vida, possuir um blog é sim, um ato de exposição. Escrever, por si só, é uma tentativa de libertar os preconceitos, as visões, angústias, problemas, ilusões, felicidade, seja lá o que for que estiver sentindo no momento. Então poderia apenas escrever e deixar lá no HD do computador, como às vezes sempre fiz, e ainda faço. Publicar. Tornar público as versões e os pedaços da vida serve como o reconhecimento, muitas vezes sagrado, da chamada alteridade.

Ao reler o meu texto no blog, sei que deixo uma parte de mim, uma contribuição, para que eu possa me entender. E talvez, possa ajudar as pessoas a se olharem da mesma forma, com uma certa compaixão pelo outro, já que é através dele, que a gente se reconhece. Acho que copiei isto de alguma aula de cinema... Ficou confuso? Em suma, o blog me ajuda a organizar as idéias, me força a agir e me impulsiona a olhar de forma mais crítica o mundo e a mim mesmo. Este é o meu espaço. E confesso. Não tenho pensado muito sobre no que escrever. Só o que vem na mente na hora que tem que ser. O resto,como dizem por aí, é resto. Então,hoje é só sentar e escrever sem pensar... muito.

quarta-feira, agosto 22, 2007

Curtas do blog

Hoje acordei por volta das 9hs. Não tinha mais sono. A vontade era de dormir mais um pouco. Depois de 30 minutos, alguns pensamentos, nem um cochilo. Melhor levantar. Como estou sem livros novos, vamos aos velhos...

Meta do mês... Deixar de assistir aos seriados do SBT. E aos poucos, migrando para a Record. Ao menos na emissora do Edir Macedo, vou poder assistir, sem surpresas de mudanças de horários. Entre as melhores estão: Dr. House e CSI:Miami

Antecipando as perguntas.Não vou assinar TV à cabo. Sei que vou continuar a assistir às mesmas coisas que são transmitidas na TV aberta.

Terminei de ler a monografia da minha amiga Érika sobre as obras do Ruy Castro: Carmem e Chega de Saudade. Muito bem redigida, a monografia explica como o autor ajuda na formação de uma identidade cultural nacional. Ponto para Érika, ao explicar como as técnicas jornalísticas somadas a uma narrativa literária foram utilizadas pelo autor para que de forma consciente, ou não, pudesse entremear na opinião pública a sua visão de uma identidade cultural brasileira. Excelente o trecho em que descreve a voz autoral da obra de Ruy Castro.

Ontem à noite, pude rever alguns conhecidos na coletiva do senador Aloísio Mercadante. Tentei assistir a sua palestra, intitulada “A política econômica do governo Lula (2003/2006)”, organizado pelo Conselho Regional de Economia (Corecon) em homenagem à Semana do Economista. Sai de lá convencido que o governo Lula é o melhor de todos os tempos. Depois da coletiva, deveria ir embora, para assistir a novela das oito. Já faz um tempo que eu não assisto. Tudo é ficção, mas a novela é mais divertida.

Saiu o resultado da prova do Estadão. Não se dignaram nem a publicar o resultado na internet. Agora é encarar a dura realidade. Para morar em São Paulo, já planejo trabalhar de empacotador de supermercado, vendedor de bilhete de metrô ou atendedor de telemarketing. Com a possibilidade do adicional noturno, posso ganhar mais do que eu ganho como jornalista.

Semana que vem a família chega aí, para curtir a formatura de enfermagem da minha irmã Camila. A super-lotação também se dá, porque a minha prima Gisely, que mora comigo, vai formar em Direito. Então, que venham as festividades.... Os vizinhos que se cuidem...

segunda-feira, agosto 20, 2007

Abaixo a pseudo democracia

- O que você tá fazendo na rua, menino? Criança tem que tá na escola, e não na rua, procurando coisa errada pra fazer. Cadê seu pai?
- Me deixa em paz, tio...

Por cerca de cinco minutos, o diálogo, ou quer dizer, o monólogo era acompanhado por quem estava no ônibus naquele momento. Era por volta das 14hs de uma quinta. O calor e a falta de umidade faziam daquele ônibus um suplício. Se fosse algum vendedor de banana, água, ou bala, continuaria nos meus pensamentos. Em pé, sentado no ferro de sustentação, próximo à entrada, o homem não parava de falar. Estava em pé, a segurar minha mochila verde, sem nenhum tipo de movimentação, só aquela impulsionada pelo ônibus. Mantive a mesma posição, sem nem mesmo olhar a cena.


O que aquele senhor dizia não era apenas um soco no estômago daquele menino. Aquilo começou a me incomodar. Ele estava em pé, à porta. Não tinha mais de dez anos. Era magrinho, camisa grande e de bermuda simples. Esta é a única descrição que posso dar. Esta foi a minha única olhada na cena, que continuava.

- Vou te levar na delegacia de menores quando a gente sair. Você não tem vergonha de com esta idade, tá na rua, vagabundeando. Tem que estudar... prá ser alguém na vida. Ou você quer ser vagabundo...
- Ai meu deus. Me deixa em paz.

Em coro com o garoto, a minha vontade era de falar. “Deixa ele em paz. O mundo é democrático. As pessoas fazem o que elas quiserem e cala esta boca, que o sr. está incomodando”. Não o fiz, certamente. Apenas esperei que tudo se acabasse. Quando entrei no ônibus, aquele senhor já estava lá, encostado na parede oposta à entrada do ônibus. Como ele ia sair, no ponto da Avenida Goiás, no centro de Goiânia, o homem havia mudado para o lado do garoto, perto da porta, só que sentado no ferro de sustentação.

O senhor, com rosto de formato quadrado, já enrugado, cabelos curtos e já falhos, sugeria uma personalidade austera. Sempre com aquela cara de sério e compenetrado em alguma coisa. Não pensei, no entanto, que pudesse demonstrar esta característica de forma tão veemente. Eles saíram, e continuaram discutindo lá fora, enquanto o menino fugia. E de repente, em poucos minutos, refletia sobre a cena e o meu pensamento.

“Não será que o mundo está deste jeito, por causa desta pseudo-democracia, em que ninguém pode mais se meter na vida de ninguém. As pessoas se desrespeitam, batem umas nas outras, quebram as regras, roubam, furam fila, e o que as pessoas falam? Exatamente nada”. Tudo isto, muitas vezes, acontece ao nosso lado, e com a desculpa de que todos fazem o que lhe aprouverem, começamos a achar “tudo” natural.

Que mudança radical de pensamento, não é. Às vezes somos levados ao imediatismo das ações. De uma forma individualista, não queremos ser incomodados. Afinal, isto não é problema da gente, não é mesmo? Só que a minha vontade, cada vez maior, por exemplo, é começar a encher o saco daqueles que jogam lixo pelas janelas dos carros e ônibus, como estivessem na própria casa. Depois quando os carros ficam parados no meio das enchetes, ficam reclamando do poder público. Acho que nós, brasileiros, precisamos ser mais chatos, metódicos, sistemáticos, e intrometidos. Nem que incomode, assim como me senti incomodado naquele momento.


terça-feira, agosto 14, 2007

A hora certa de partir

Que sensação é esta que surge? Brota aos poucos, de forma sistemática, sem nem avisar. Como já estou esperto com esta vontade de mudar tudo, analiso racionalmente as primeiras conseqüências, e em uma audácia que toma conta dos mortais, também passo a analisar num futuro distante. Apesar dos pensamentos, não há como saber como uma mudança, seja ela simples ou radical, possa alterar, para o bem ou para o mal, os rumos da sua vida.

Como estas indagações não vão me fazer andar, ou seja, apenas angustiam ainda mais o cotidiano coberto de certezas, torna-se preferível pensar em razões práticas. A verdade, para mim absoluta, é que nada me prende. Posso mudar para São Paulo, Salvador, Rio de Janeiro, Londres ou Nova Iorque. E não sentiria nenhuma diferença perceptível. Continuaria andando em transportes públicos lotados, dormindo as minhas oito horas (ou até mais) tranqüilamente, trabalharia para sobreviver, leria os mesmos livros, sentiria as mesmas saudades, principalmente daquilo que não volta mais.

O que ainda estou fazendo aqui? Esperando a melhor hora de partir, preparando-me para a próxima viagem. E sem pensar muito no que deixei para trás. Até porque, a sensação é que nada do que passou me pertenceu um dia. Passou como aquele pássaro que voa em direção ao sol que se põe. Ou então como aquela cena em que tento, em vão, gravar na memória.

Da sacada do prédio, vejo alguém andando apressado, passos firmes, que apenas disfarçam a insegurança daquela nova viagem. Mochilas nas costas, o rapaz dobra a esquina, dá uma olhada para trás, como quem quisesse se despedir. Como não há muito tempo, ele olha para a frente, na direção que precisa seguir.

Este sou eu, novamente, olhando o “eu” que precisa fugir. Minutos antes, debruçava-me no parapeito da sacada, querendo lembrar de tudo desesperadamente, como em um filme, que avalia em um curto espaço de tempo, toda uma vida. Já dentro do ônibus, de volta para casa, esqueço tudo rapidamente. E tudo o que vem adiante é uma estrada limpa, pronta para ser percorrida, sem nenhum tipo de mágoa ou desilusão. Pronto para a próxima parada.

Livremente inspirado em uma crônica de Rubem Braga, incluída no livro “Ai de ti Copacabana”

terça-feira, julho 24, 2007

Top do Eixão

Sair de casa, ir ao terminal da praça da Bíblia (agora mais perto de casa), pagar os R$ 0,50, e disputar uma vaga entre os humanos para entrar nos bi-articulado do eixo Anhanguera, parece realmente uma batalha. Uma rotina, que a partir do último mês, passou a ter uma trilha sonora. Sem cantor ou banda, música ou propaganda pré-definida, escutar rádio parece mais adequado aos balanços do eixão. “Paga.. pa...pa...paga o IPTU. Tá muito caro prefeito”.

Para agüentar o transporte público em Goiânia, que beira a uma tragédia sem fim, só mesmo com um fone de ouvido. Depois do pen-drive quebrado, o disk man voltou à ativa. Como ele fica jogado dentro da bolsa, praticamente lacrado, preciso ter sorte para passar uma música que realmente eu curta. Um rock parece mais adequado ao movimento. “What I´ve done. I´ll face myself. To cross out”. Quando passa uma balada romântica, o jeito é olhar para fora. A sensação é a mesma de quando a gente está em um elevador lotado sem conhecer ninguém. “When you-re gone. The pieces of my heart are missing you”. O jeito é continuar a ouvir. Mas só com um fone. Assim como acontece com os intermináveis e gritantes comerciais de rádio.

Às vezes, andar no ônibus ouvindo música parece um clipe de música, mal feito, daqueles clipes da MTV, quando os cantores começam a carreira. Improvisados, daqueles que as pessoas passam na frente da câmera, sendo que alguns olham, e outros até, dão uma risada bem grande, e termina tudo com uma pessoa de braços abertos para o sol. Acho que aquela nova do skank cairia bem neste estilo de clip. “Uma canção é para acender o sol, no coração da pessoa. Para fazer brilhar como um farol. O som depois que ressoa”.

Se ouvisse rádio Terra FM, acho que teria esta mesma sensação. A qualidade do clipe, no entanto, seria pior. Em outros momentos, deixo de prestar atenção nas pessoas e na profusão de entra e sai, viro-me para a janela. E novamente, vem à cabeça aquelas cenas de novela, quando querem mostrar o cotidiano. As gravações sempre acontecem dentro de feiras, terminais de ônibus e no centro da cidade. No eixão, a novela nunca parece sair do subúrbio, apesar de passar pelos mais diferentes lugares, como o largo das rosas, pela avenida Goiás, e pelas periferias da cidade.

Dentro do ônibus, na feira, andando apressado pelo centro de alguma cidade, ou eu mesmo, dentro daquela bola que balança, ouvindo uma canção do estilo skank para os românticos, ou então, aquela nova da Fergie (rasga nega), que passou no Big Brother. “da da da da... I hope you know. I hope you know. That this has nothing to do with you”. Vou ouvindo a rádio Interativa Fm, porque é a hora do top 10, e como eles gabam em dizer, não tem muito comercial. E como não fico muito à vontade para abrir a mochila, tirar o disk man, e mudar o dial, o jeito é ouvir o que vier.

O importante é concentrar na letra, e esquecer o restante. Quando a letra é inglês, melhor ainda, tentar traduzir. Aquela nova do Akon parece tranquila. “Nobody wanna see us togetther, but it don´t matter no. Cause I Got you baby”. Quando alguém começa a gritar. “Olha a água. O copo é R$ 0,50 e a garrafa R$ 1,00. Olha a água”. Está bem, começou a parte do rap mesmo, aí não ia ter como concentrar na letra. Viro-me dentro daquela bola, que fica entre as articulações do eixo. Vou ficar olhando para fora mesmo. Às vezes ameaço a mexer os lábios, mas sem emitir nenhum som. Só para acompanhar o ritmo.

Acho que estou chegando ao ponto da cascavel, um ponto antes do terminal do Dergo. Acreditem, esta é a hora mais complicada, que precisa de técnica, experiência, e um pouco de falta de educação. Chegou a hora de sair do eixão. Nesta hora, a música da Ivete Sangalo parece bem adequada. Senão no ritmo, mas na letra. “Mas um dia vem, e deixo você ir. Deixo você ir... nannanana... Deixo você ir...”.

Quando eu saio, espraguejando até a 10º geração do povo que não sai da porta, começa a tocar aquela música da Banda luxúria chamada Lama. Também bastante adequada ao momento. “Volta, ou vai embora, meu amor. Sem ameaças ensaiadas na frente do espelho. O caminho mais fácil, nem sempre é melhor que o da dor”. Afinal, ir ao trabalho é uma relação de amor e de ódio.E de ônibus parece que a relação anda sempre complicada. Mas como ouvir música é justamente para não pensar em nada complicado. Vamos à música.... “Deixa acontecer naturalmente....”

Trilha: Eixo Anhanguera

segunda-feira, julho 23, 2007

A luta nunca acaba


A íngreme descida do estacionamento parece levar para um mundo diferente. Não que seja virtual, ou irreal, mas um mundo diferente. O elevador panorâmico dá uma sensação de liberdade. Ao abrir as suas portas, deixam-se para trás os problemas do terceiro mundo. Esquece-se que aviões explodem ao colidirem com prédios, excluídos vivem de migalhas nos sinaleiros, homens se tornam escravos, e que os políticos e juízes aumentam os seus salários, enquanto o restante da população precisa sobreviver com um parco salário mínimo.

Ao entrar no ambiente climatizado, iluminado, com o cheiro do novo e moderno, a certeza é que o shopping foi construído para uma elite preocupada em esquecer dos problemas do terceiro mundo. Ao andar pelo Shopping Bouganville detestei morar no terceiro mundo, e principalmente, ser classe média. Ao comer uma pedaço de torta (o mais delicioso que já comi), por uma bagatela de R$ 5,90, queria nunca ter entrado naquele lugar. Preferia ficar na ignorância de quem só comeu bolo de fubá, ou então, bolo de nata, que são pratos igualmente deliciosos, mas sem o fetiche do primeiro mundo, com o sabor da exclusão.

Ao comer aquele pedaço de torta, naqueles contados minutos, senti como uma classe média, que trabalha para tentar se incluir na pirâmide de uma elite, que mora nos condomínios bem longe da pobrada, usa ar-condicionado central , carro blindado, óculos coloridos, roupas de grife e freqüenta universidade pública gratuita e de qualidade. Depois de uma hora, ao subir a rampa do estacionamento, depararia com o terceiro mundo. E novamente pensaria. “Detesto ser classe média. Nunca vou me tornar rico, e vou morrer tentando ser um”.

Integro a classe daqueles que integram o “status quo”, defendem e sustentam o capitalismo, e contraditoriamente, desejam acabar com as desigualdades sociais. Apesar de ser um otimista convicto, assim como todos os brasileiros, sai do shopping com um pessimismo de críticos como Marx, Adorno, Marcuse. O mundo não é justo. As desigualdades não vão acabar. E tudo vai se perpetuar.

Das idéias de um revolucionário convicto, César Benjamim, mais conhecido como Cezinha, descrito no livro “1968: O ano que não terminou”, escrito por Zuenir Ventura, encontrei um sopro de otimismo. A luta dos revolucionários durante a ditadura produziu ensinamentos valiosos. Uma delas é que a luta nunca acaba. Os problemas brasileiros, ao contrário, ganharam uma outra forma, mascarada nos discursos dos políticos, nos números fabricados, na imprensa manipuladora, e principalmente, na acomodação de quem pensa que as coisas não mudam, e que a vida é assim. Injusta por natureza. “Nenhuma ordem totalizante impede que o campo das possibilidades seja maior do que o que está sendo realizado. O que ela consegue, em certos momentos, é impedir que se pense na possibilidade de alternativas”, avalia sabiamente Cesinha.

O que os brasileiros fazem para resolver os problemas? Muitas vezes cruzam os braços, mas em muitos momentos decisivos da sua história, resolveram descruzar os braços, e reclamarem os seus direitos de cidadãos. Para quem acha que o brasileiro tem memória curta, a história sempre se repete, com a diferença que os objetivos sempre evoluem. Da luta dos homens para a Independência de Portugal, instituição da República, fim das oligarquias e da ditadura getulista, Diretas Já, Fora Collor, sempre há uma lembrança de luta introjetada na vida dos brasileiros, que suportam como nenhuma outra nação o peso de todos os tipos de desigualdade. Em uma luta diária, que rouba por demais a força e a auto-estima do nosso povo.

Trilha: Shopping Bouganville,em Goiânia

sexta-feira, junho 29, 2007

Amigos do Planalto

É público e notório que o Palácio do Planalto não viraria as costas para o seu aliado de todas as horas, o presidente do senado Renan Calheiros (PMDB-AL). Os responsáveis pela articulação do governo no senado o defendiam nos bastidores. Havia também os mais explícitos, como a líder do PT, senadora Ideli Salvati e do governo no Senado Romero Jucá (PMDB). Ao ver o navio naufragar, com toda a sua bancada, o presidente Lula fez uma defesa memorável do senador, em que na oportunidade, novamente pediu para que os acusados não fossem considerados culpados, até que a Justiça assim fizesse.

O discurso, recorrentemente usado, até pelas defesas anteriores do seu irmão Vavá, acusado de tráfico de influência, conquistou um novo simbolismo com os tapinhas das costas de Renan ao presidente Lula, depois da defesa pública. E a tropa de choque do presidente entrou com toda a força ao presidente, como os ministros Tarso Genro, da Justiça, e Dilma Roussef, da Casa Civil. Por todos estes motivos reafirmo que esta defesa tornou-se memorável.

Com base no coleguismo e questões políticas intrínsecas aos desejos do governo federal no Senado, os tapinhas simbolizam uma nova fase da relação do executivo com as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. Ao invés de manter-se isolado, assim como pede o decoro, o governo passa nas entrelinhas de que as investigações não são tão irrestritas quanto se imagina. Tudo depende da peça do tabuleiro alvejada. Desde que teve início o furacão de operações, não havia nenhuma exposição do governo de deixar tão clara a sua posição.

Em seus argumentos, Lula supõe que a opinião pública não tem capacidade de entender que as denúncias são alvo de uma investigação. E parece implorar que a imprensa, a opinião pública e a população se manifestem somente depois que as ações transitarem em julgado. Não se deve mais falar em investigações, ou acusações, até quando a Justiça julgue ou condene. Talvez Deus sabe quando, daqui 15 anos, quando ninguém mais se lembrar do senador, a justiça venha, lenta e segura.

O presidente Lula se esquece que Renan, assim como todos os representantes no Congresso Federal, possuem imunidade parlamentar. E ao que já se sabe, a Comissão de Ética do Senado, abandonada pela conveniência, não deve votar antes do recesso parlamentar a sua permanência. Se havia alguma dúvida de que a votação ficaria para agosto, depois do recesso parlamentar, os tapinhas nas costas afugentaram todas as dúvidas.

Antes o presidente dizia que apesar da lentidão da Justiça, ao menos há uma investigação séria e consistente, que não distingue cor, credo ou classe social. Chega-se uma nova fase. Agora, é preciso calma para não expor os investigados, à execração pública, principalmente aqueles passeiam pelo Planalto. Como a Justiça vai reagir a isto? Com calma e serenidade. Assim como querem que o sr. presidente gostaria que a opinião pública agisse.

quarta-feira, junho 27, 2007

A realidade das novelas

Na estratégia, bastante discutível, de entremear o noticiário do Jornal Nacional com as novelas, a TV Globo atrai não apenas públicos diversos, mas bagunça o que deveria ser, na teoria, claramente dividido. A ficção e a não-ficção entram, neste sentido, para dar um contexto verossímil do mundo, tão confuso quanto a rede de conexões que permeia a vida de qualquer mortal. As pessoas, no inconsciente, misturam as artimanhas do vilão Olavo Novaes (Wagner Moura), da novela Paraíso Tropical, com a não menos interessante rede de intrigas do senador Renan Calheiros, presidente do Senado Federal.

Em um ideal, que merece ser diagnóstico e delineado, a separação entre a ficção e a não-ficção parece cada vez menos importar a quem realmente interessa: o público. Esta é uma dualidade, em que a convivência apenas fortalece a troca de símbolos e que passa a representar de forma mais clara, e útil, as mudanças do mundo. Nem sempre os resultados da separação total das dualidades, assim como sonho e o pesadelo, verdade e mentira, bem e mal, caracterizam como um espectro interessante. Ao contrário, na maioria dos casos, falsifica o que deveria realçar, simplifica o que deveria contextualizar. Escondem-se as verdadeiras interligações entre fatos e sentimentos.

Na ficção Olavo fecha negócios escusos, molha a mão de um funcionário para vencer uma licitação, deixa funcionários sem condução, no meio de uma guerra civil na África, com o único intuito de reduzir os custos, confronta o bom mocismo do folhetim e se apaixona por uma prostituta. Estas cartas estão na mesa. Não há, no entanto, por parte do público a intenção de demonizá-lo, e sim, compreendê-lo, não de forma ingênua. No fim, claro, o público exige uma punição, mas sem antes, claro, entender os reais motivos da trama que o levou a cometer estes atos, na maioria das vezes, imorais.


Em uma trama, desta vez no Senado Federal, Renan trai a esposa com uma jornalista, a bela Mônica Veloso, tem um filho, com a pensão paga mensalmente pelo lobista Cláudio Gontijo, da construtora Mendes Júnior. O pai zeloso também cuida do futuro do rebento, ao pôr R$ 100 mil na conta do garoto, o que chama de “bolsa de educação e cultura”. E depois de tudo, a esposa do senador alagoano assiste a tudo, digna do comportamento vitoriano de Hillarie Clinton, no caso Mônica Lewinski. E quando, os “amigos” começam a fugir, como os ratos no naufrágio, ele ameaça contar os podres de quem lhe virar as costas. Esta é uma história real, contada de forma fragmentada pelos jornais. Os fatos poderia, sem dúvida, serem melhor entremeados e explicados. O que ajudaria a opinião pública a contestar com maior veemência a permanência de Renan no Senado, condicionada atualmente pelo conluio de amizades que apostam no esquecimento da população.

Que as novelas, até como uma tentativa de sobrevivência, abusam da realidade, modificam o ponto de vista dos brasileiros, e ajudam a moldar o senso crítico, e a moral dos brasileiros, não há nenhuma dúvida. Tudo isto porque as novelas tentam acompanhar o ritmo da sociedade. Já o Jornalismo ainda trabalha com os antigos pressupostos de verdade, objetividade e parcialidade. E com o medo de transpor estes princípios, como um santo dentro de um convento, amendrotado com a punição de salvar a sua alma, não avança como deveria na cobertura dos acontecimentos.
A realidade dos noticiários deixou, há muito tempo, de ser a mesma dos brasileiros. Enquanto a ficção, de forma natural, leva a discussão para a sala dos brasileiros, o Jornalismo tenta, em vão, recorrer ao conservadorismo, para proteger os pobres e os oprimidos. Até os super-heróis, com os seus códigos de honra, precisam mudar. O que a ficção faz continuamente, a atualizar com base na realidade, e começa a suprir o que o público realmente está interessado: a verdade, com o contexto da realidade, e se não for pedir muito, com uma pitada de bom humor e sem o tom didático e professional.

Fotos: Olavo Novaes - Rede Globo; Renan Calheiros - Agência Brasil


sexta-feira, maio 18, 2007

Teatro da Vida



A casa lotada, na estréia, parece agora vazia. Qualquer sussurro pode ser ouvido claramente. Os atores parecem estar ao seu lado. O teatro continua a esvaziar. As pessoas saem uma a uma. A cortina, aquela vermelha tradicional, se fecha. Não há mais ânimo para continuar. A companhia, antes completa de profissionais, fica solitária. Não há mais show, daqueles de encher os olhos, como os musicais da Brodway. Transformou-se em um monólogo, em que o artista passa a dividir, a partir de agora, as suas melancolias.

Diante disto, o público reage, e começa a interpelar, o artista. Sem maquiagem, máscaras, cenários, e com uma iluminação precária, apenas uma luz que dá vazão ao olhar compenetrado do ator, sentado em um banco, com um fundo preto, atrás para contrapor, à sua roupa branca. Ali, sozinho, antes acompanhado, antes coadjuvante. Agora uma estrela solitária, uma estrela em agonia, marcada pelo ritmo lento das falas, da falta de vigor para domar o palco. E ali, na sua frente, alguns poucos, não mais pagantes, apenas convidados.

Na forma crua, sem nenhum encanto, mas transparente, real, sem nenhuma ilusão, de aquela cena vai mudar para sempre a sua vida. Que aquele salto diante da mocinha pode conquistá-la. Ou que a voz firme e ríspida pode afastar o vilão. A sua experiência mostra que o público não se lembra destas cenas. Lembra do olhar meio atravessado, enquanto esquece a fala, dos risos frouxos depois que esqueceu o roteiro, do momento em que o artista reverencia o público, ou quando este se aproxima para dizer as suas impressões do show.

Destes momentos, fora de contexto, considerados errados, mas que enriquecem uma obra. E neste momento, cabisbaixo, sem nada mais para dizer, começa a ouvir barulhos, que já tinha esquecido. O toc toc dos sapatos entram. Juntamente com os aplausos da persistência daquele herói, que não desistiu da batalha. E que se mostrou por inteiro. Com a experiência e presença de espírito, de quem lutou muito, e perdeu bastante. Os aplausos cortam o ar, e vão até o coração. Uma última olhada. Uma última cena. Esta sim, para ser lembrada. De um verdadeiro artista da vida.

O show precisa continuar

Às vezes, bate aquela louca paranóia. Eu poderia agir desta forma, ou deste jeito, neste exato momento? Esta seria a melhor hora de brigar, ou de ficar calado? As cenas começam a desencadear lentamente, como uma previsão de um futuro, que nunca vai acontecer. Não daquela maneira. Com aquelas mesmas palavras, sorrisos, expressões faciais. Talvez seria melhor chegar lá, e falar de forma mais ríspida. Ou então, bater o pé no chão, esticar o dede, em riste, dizer uma frase de efeito, e ir embora.

Assim como um dramalhão mexicano, com aquelas pessoas bonitas, vestidas com cores fortes, e com as vozes empostadas dos dubladores brasileiros. Às vezes, com a fina ironia, e com a alegria de Almodóvar, como a cena em que Penélope Cruz enterra o companheiro, em “Volver”, como uma heroína, que precisa fazer o necessário, sem mesmo pestanejar. Ou ainda como o Dr. House, da série norte-americana , uma metralhadora de frases de efeito, sustentada pela sua bengala, mas sempre com ações medidas para tentar esconder os verdadeiros sentimentos.

A realidade carrega um outro encanto. Não tem trilha sonora. A roupa, muitas vezes, desapropriada para a ocasião. A voz embarga, no momento em que o personagem deveria falar bravo. A câmara não se aproxima enquanto o seu olho começa a marejar. Na saída, para terminar a deficiência de toda a cena, o ator esquece a fala, no momento mais importante, e fica ali, parado, esperando alguém soprar o texto. Tarde demais. O diretor, lá em cima, parece dizer, agora é no improviso. E assim, as coisas funcionam. Como um eterno ensaio, com um texto complexo, personagens verossímeis, com falas chatas e intermináveis. Ah!! Os cacos também são permitidos. E durante toda a temporada, o texto muda, assim como a conveniência e o humor dos atores. Estes, adoecem, ou precisam tirar férias. E assim, tudo mudo. O tempo todo.

terça-feira, abril 24, 2007

Escritor: Profissão em extinção ?

Pensar, e pior ainda, escrever algo inteligente é muito difícil. Para redigir esta frase não demorei mais que alguns minutos. Talvez porque eu esteja escrevendo em um blog. Isto também implica que qualquer um pode escrever qualquer coisa. E pode mesmo.

Também fiquei pensando porque não nascem mais tantos escritores talentosos. Meu pensamento ainda está confuso sobre este assunto. Talvez seja porque as pessoas precisam trabalhar? Ou porque ninguém mais financia todo o processo artístico literário, apenas o produto? Ou porque existem escritores de mais e leitores de menos?

Agora tenho uma fiapo de explicação. Parece que todo o mundo já disse tudo. Então para quê escrever um livro sobre o que já foi dito? A coisa piora quando é ficção. Depois de um tempo, sempre algum livro parece com aquela novela, ou, com aquele filme. Escritor hoje precisa suar bastante para estimular a criatividade.

E alguns ainda insistem em se basear na realidade. Sempre tem alguém para dizer que algo aconteceu lá na Virgínia, ou na coletiva de Sandy e Júnior, ou que a Grazi separou de fulano, ou que, o monte de juiz corrupto foi preso pela Justiça federal. Essa realidade parece uma obra de quem não tem o mínimo de criatividade.

Há sempre aqueles que consideram as obras de ficção mentiras e pura bobagem. Isto porque ainda não assistiram a TV Câmara ou a TV Senado. Uma competição de deixar Peter Jackson, Walt Disney, ou mesmo, Gabriel Garcia Márquez, no chão. Aquilo sim é pura ficção fantasiosa.

Está bem... Não sou déspota, nem autoritário, a ponto de achar que a informação seja prejudicial. Ao contrário, as pessoas precisam estar bem informadas para governarem as suas vidas. Ou mesmo, para se ordenarem nesta louca vida – regida pela solidão das grandes cidades à violência dos rejeitados. Há sempre algo acontecendo o tempo. E sempre tem alguém para dizer isto a um outro alguém. Isto é fato.

Mas isto cria uma conseqüência. As pessoas não podem mais ficar sozinhas para refletir a sua vida. Há sempre uma televisão ou um rádio para dar uma mãozinha na solidão. Se há algum ponto de tristeza, se algo deu errado naquele dia, a pessoa já pode estar à beira da depressão. Deve ser por isto que há poucos escritores. Ninguém mais quer conviver com a solidão.

Trilha: Viagem literária

quarta-feira, abril 04, 2007

Para tirar a teia de aranha

Os leitores foram abandonados? Não sei. Desculpa muitas vezes o egoísmo. Mas não considero o blog um espaço para os leitores. Apenas para as minhas pseudo reflexões, ou mesmo, um espaço para dividir as minhas experiências, angústias e outros problemas. É um espaço meu, que divido com quem queria ler algumas besteiras. Como sei que os eventuais leitores tiveram muitas coisas para fazer neste início de ano, não me senti mal pela demora. Era eu quem não estava à vontade. Queria esperar passar o ano.
Estou eu aqui no meu trabalho, escrevendo estas coisas, para dizer que o meu ano não começou no dia 1º de janeiro, nem depois do carnaval, mas quando eu decidir fazer coisas diferentes. Primeiro foi a mudança de apartamento e mais recentemente o fim de uma especialização. Ainda não fiz nenhuma lista de ano novo, nem vou fazer. Como mudo muito os meus planos, passa alguns meses, eles não servem para muita coisa.
Novo apartamento
Sol de meio-dia. O espaço abandonado. Janelas e portas fechadas. A cada passo... um barulho. Minha mãe e a minha tia entram primeiro. Elas se encantam com a cozinha, ampla e com uma pia bem maior do que o do apartamento anterior. Entro, e já vou direto para os quartos. Um deles tem até varanda. Também tem persiana nas janelas. Bom para quem gosta de dormir muito. E o apartamento ainda nem precisa ser alugado pela imobiliária. É com a dona. O preço é uma pechincha.

Assinado o contrato. É do lado da praça da Bíblia. Algum problema? Por mim, tudo bem. Os barulhos incomodam às vezes. Mas para um cara “dormidor” como eu. Nada deve atrapalhar. Depois da enrolações para entregar o outro apartamento, correndo atrás das papeladas, nada melhor do que deitar e ver que os problemas, ao menos estes acabaram. Até quando ficarei assim. Tranquilão. Na boa. Não sei.

Sonho
Só sei que depois de resolver um problema com a burocrática e enroladora Tropical, decidir ser mais chato do que nunca ao decidir as coisas, em assinaturas de contratos. Ou melhor, se eu precisar destes sangue-sugas eu prefiro morar debaixo da ponte. Eu acho que eu disse isto para a atendente. Aquele mentirosa, filha de uma... Já passou a raiva, mas devo ter praguejado as quatro gerações daquela coisa ruim. Só que mesmo variando os caminhos, eles continuam iguais. O processo mecânico ajuda a lembrar dos problemas. É como se você fosse teletransportado. Quando você vê, já está cumprimentando as pessoas no seu trabalho. E não percebe que você pegou o ônibus lotado, atravessou uma avenida e apenas olhou, não apreendeu.
Ah! Estes dias eu me peguei na beira da praia, em pleno pôr do sol. Não sei se sonhei, ou pensei que estivesse com o pé na areia. Estava sentado, vendo o sol baixar. Os tons azulados e alaranjados do sol se misturavam. Olhava pacientemente, sem nenhum pensamento na cabeça. Só o vazio. Sei que quando eu morar na praia, não será bem assim. Mas aos corvos e abutres de plantão, não venham azedar o meu sonho ou pôr areia no meu tênis. Sei dos problemas e das dificuldades, mas com uma praia e o pôr do sol devem ser bem mais agradáveis de resolver.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Sorriso como remédio



O azul das paredes reforça a sobriedade. De longe, as árvores circundam o quarteirão do Hospital das Clínicas (HC) de Goiânia, como se quisessem protegê-lo. Além das árvores e dos sentimentos que permeiam o ambiente do hospital, uma reforma na parte interna modifica a paisagem. Dentro concentra-se uma multidão apressada, sempre com uma queixa, seja de dor ou da espera para o atendimento. É sempre na agonia que os verdadeiras reações se afloram.

Nas mãos de médicos e enfermeiros a cura pode estar dentro de um frasco ou em cartelas de medicamentos. Só que naquele momento, os profissionais parecem desconhecer uma solução apaziguadora para os olhares perdidos, que buscam compaixão, ou mesmo, uma palavra consoladora. Já para Luzianira da Cruz Montes Campos (foto) o remédio está além das cientificidades dos laboratórios. É algo que não se encapsula, não se aprende na faculdade, e não se mensura por meio de instrumentos analíticos. De estatura baixa, no máximo 1,55 metro, quadril largo e rosto rechonchudo, ela parece crescer ao subir o pequeno degrau. O sol, ainda brando por causa das nuvens, ilumina a sua camisa de estampa preta, mas manchadas pelos coloridos azuis e amarelos.

Apesar de andar um quarteirão para chegar ao hospital, o coque feito em seu cabelo, já uniformemente grisalho, está intacto. Mesmo com o vento que se abate naquela manhã nublada, ela anda graciosa, sem pressa, observando todos os detalhes, sempre com um sorriso no rosto, como se compartilhasse aquele momento com aquelas pessoas que estavam no corredor. Azar daqueles que não percebem as sutilezas do seu sorriso, um grande remédio para a alma. Se pudesse transparecer o momento de forma física, diria que em volta dela, uma luz com combinações de azul claro e amarelo fogo transcende por onde passa.

Já no rol de entradas dos ambulatórios, ela agora vira onde a seta indica o nome voluntariado. Luzianira entra no pequeno corredor; continua devagar, com a experiência de quem já passou por tudo. As janelas abertas dos ambulatórios que dão para o corredor não a atrapalham. Olha em volta, vê salas com aparelhos de medir pressão, maca e mesa vazias. Desvia o olhar e segue em frente. A cena se repete nas outras duas janelas, também abertas, por onde atravessa. O silêncio só se quebra com um burburinho de um lugar ainda não identificado.

Na última sala do corredor, a senhora abre a porta por onde entra sempre uma vez na semana, sempre às quartas feiras. O que se repete há cinco anos. Com os seus bordados a tiracolo, Luzianira finalmente adentra a sala do voluntariado. Saia azul até os joelhos e uma sandália marrom com um pequeno salto, talvez com uns dois centímetros, completam o visual desta bordadeira de mão cheia. Assim também estavam as suas mãos com um bordado ainda por terminar, que também segurava as linhas de crochê.

Como os seus bordados, a sala do voluntariado do HC também desconhece a uniformidade e os padrões. Um pouco maior que um quarto de seis metros quadrados, as suas paredes são brancas, assim como os dos ambulatórios vistos por Luzianira, mas o mosaico de cores e formas se completa com as roupas, de todas as tonalidades, doadas para serem vendidas nos oito bazares realizados durante o ano, geralmente em datas especiais. Destes eventos, é de onde o Voluntariado do HC tira a sua receita para ajudar os pacientes do hospital.

Luzianira senta e começa a bordar. Ao mesmo tempo, não deixa de prestar a atenção em quem entra na sala. Experiência demonstrada não apenas pelas rugas, mas pela calma que conduz a voz e os gestos, nunca bruscos. Veloz só a forma como entrelaça as linhas vermelhas no pano que vai formando pequenas rosas. No momento, estavam mais duas pessoas na sala, ambas cuidando dos adereços para a festa de fim de ano da instituição. Mas os seus ouvidos conseguiam captar os rangidos das portas, sempre seguidos de uma virada de cabeça.

Do sofrimento à doação
Voluntária desde os 17 anos, quando ajudou o Congresso Internacional Religioso, ainda quando morava no Rio de Janeiro, Luzianira sempre fez trabalhos voluntários. “Sempre ajudei muito. E faço com o coração”. Não havia um motivo pré-estabelecido. Era só a vontade de ajudar. Uma atitude positiva não só em relação aos outros, mas à vida. De miss em Santa Helena, sua cidade natal, localizada no interior goiano, aventurou-se ao Rio de Janeiro, quando chegou aos 16 anos.

Depois foi para Brasília trabalhar na área de telemarketing. Em seguida se estabeleceu em Goiânia. Ajudava de forma esporádica, apenas com doações de alimentos e roupas. Nos últimos anos ela intensificou a sua doação ao movimento voluntário, quando o esposo morreu há seis anos de cirrose. “Nós andávamos por estes hospitais, e acabei conhecendo o trabalho do hospital das clínicas. Só depois fui conhecer os outros lugares”.

Pelas manhãs, Luzianira trabalha como voluntária em quatro instituições diferentes. Além do voluntariado do HC, também ajuda com os seus bordados o Grupo Nossa Senhora Auxiliadora e a Associação Goiana dos Diabéticos. No Hospital Araújo Jorge distribui alimentos aos pacientes. Em todos estes locais, ela trabalha em média quatro horas semanais. Às tardes se ocupa com a máquina de costura, de onde ajuda com o sustento da casa. Mas sempre lembra de produzir peças para o voluntariado. Já que o período de quatro horas, como ela mesma diz, é insuficiente para que possa produzir as peças. Ela vai sempre a pé para os locais, que não são tão distantes do seu apartamento, com quem divide com a filha.

A osteoporose e a hipertensão não a impede de realizar todos os seus afazeres, incluindo as suas idas aos trabalhos voluntários. Ao contrário, o trabalho voluntário ajuda a envelhecer de maneira ativa. O National Institute of Aging, uma entidade norte-americana, demonstrou recentemente que a atividade do voluntariado produz um bem que ultrapassa a fronteira do psíquico e chega à estrutura do próprio corpo. Em resultados práticos, isto quer dizer que as aquelas pessoas acima de 60 anos que fazem atividades voluntárias apresentam maior queima de calorias, 40% superior, do que os idosos que praticam exercícios regulares. A atividade do voluntariado também proporciona sensação de bem-estar, protege contra a ansiedade e a depressão, estimula a energia, ajuda a viver mais, eleva a auto-estima relacionada com maior acesso social, uso dos conhecimentos e sensação de ser útil a alguém.

Com o voluntariado, os idosos mantém-se socializados, além de fazerem atividades no momento em que se deslocam para irem até o local onde são voluntários. Para Luzianira, o sofrimento depois da morte do companheiro transformou-se em uma filosofia de vida que desrespeita a idade, sexo ou mesmo status social. É o espírito da solidariedade, que há de se ressaltar, é muito mais do que dar esmola a quem necessita, ou mesmo, fazer algum tipo de doação durante os dias das crianças ou natal, é ter a coragem suficiente para doar uma parte do seu tempo para o bem. Apesar de todos os problemas do dia-a-dia, o voluntariado caracteriza-se como uma ação ao outro. Quando as pessoas param e refletem, nao apenas sobre si mesmo, mas sobre o mundo.

Trilha: Voluntariado do Hospital das Clínicas
Fotos: Paulo José