sexta-feira, junho 29, 2007

Amigos do Planalto

É público e notório que o Palácio do Planalto não viraria as costas para o seu aliado de todas as horas, o presidente do senado Renan Calheiros (PMDB-AL). Os responsáveis pela articulação do governo no senado o defendiam nos bastidores. Havia também os mais explícitos, como a líder do PT, senadora Ideli Salvati e do governo no Senado Romero Jucá (PMDB). Ao ver o navio naufragar, com toda a sua bancada, o presidente Lula fez uma defesa memorável do senador, em que na oportunidade, novamente pediu para que os acusados não fossem considerados culpados, até que a Justiça assim fizesse.

O discurso, recorrentemente usado, até pelas defesas anteriores do seu irmão Vavá, acusado de tráfico de influência, conquistou um novo simbolismo com os tapinhas das costas de Renan ao presidente Lula, depois da defesa pública. E a tropa de choque do presidente entrou com toda a força ao presidente, como os ministros Tarso Genro, da Justiça, e Dilma Roussef, da Casa Civil. Por todos estes motivos reafirmo que esta defesa tornou-se memorável.

Com base no coleguismo e questões políticas intrínsecas aos desejos do governo federal no Senado, os tapinhas simbolizam uma nova fase da relação do executivo com as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. Ao invés de manter-se isolado, assim como pede o decoro, o governo passa nas entrelinhas de que as investigações não são tão irrestritas quanto se imagina. Tudo depende da peça do tabuleiro alvejada. Desde que teve início o furacão de operações, não havia nenhuma exposição do governo de deixar tão clara a sua posição.

Em seus argumentos, Lula supõe que a opinião pública não tem capacidade de entender que as denúncias são alvo de uma investigação. E parece implorar que a imprensa, a opinião pública e a população se manifestem somente depois que as ações transitarem em julgado. Não se deve mais falar em investigações, ou acusações, até quando a Justiça julgue ou condene. Talvez Deus sabe quando, daqui 15 anos, quando ninguém mais se lembrar do senador, a justiça venha, lenta e segura.

O presidente Lula se esquece que Renan, assim como todos os representantes no Congresso Federal, possuem imunidade parlamentar. E ao que já se sabe, a Comissão de Ética do Senado, abandonada pela conveniência, não deve votar antes do recesso parlamentar a sua permanência. Se havia alguma dúvida de que a votação ficaria para agosto, depois do recesso parlamentar, os tapinhas nas costas afugentaram todas as dúvidas.

Antes o presidente dizia que apesar da lentidão da Justiça, ao menos há uma investigação séria e consistente, que não distingue cor, credo ou classe social. Chega-se uma nova fase. Agora, é preciso calma para não expor os investigados, à execração pública, principalmente aqueles passeiam pelo Planalto. Como a Justiça vai reagir a isto? Com calma e serenidade. Assim como querem que o sr. presidente gostaria que a opinião pública agisse.

quarta-feira, junho 27, 2007

A realidade das novelas

Na estratégia, bastante discutível, de entremear o noticiário do Jornal Nacional com as novelas, a TV Globo atrai não apenas públicos diversos, mas bagunça o que deveria ser, na teoria, claramente dividido. A ficção e a não-ficção entram, neste sentido, para dar um contexto verossímil do mundo, tão confuso quanto a rede de conexões que permeia a vida de qualquer mortal. As pessoas, no inconsciente, misturam as artimanhas do vilão Olavo Novaes (Wagner Moura), da novela Paraíso Tropical, com a não menos interessante rede de intrigas do senador Renan Calheiros, presidente do Senado Federal.

Em um ideal, que merece ser diagnóstico e delineado, a separação entre a ficção e a não-ficção parece cada vez menos importar a quem realmente interessa: o público. Esta é uma dualidade, em que a convivência apenas fortalece a troca de símbolos e que passa a representar de forma mais clara, e útil, as mudanças do mundo. Nem sempre os resultados da separação total das dualidades, assim como sonho e o pesadelo, verdade e mentira, bem e mal, caracterizam como um espectro interessante. Ao contrário, na maioria dos casos, falsifica o que deveria realçar, simplifica o que deveria contextualizar. Escondem-se as verdadeiras interligações entre fatos e sentimentos.

Na ficção Olavo fecha negócios escusos, molha a mão de um funcionário para vencer uma licitação, deixa funcionários sem condução, no meio de uma guerra civil na África, com o único intuito de reduzir os custos, confronta o bom mocismo do folhetim e se apaixona por uma prostituta. Estas cartas estão na mesa. Não há, no entanto, por parte do público a intenção de demonizá-lo, e sim, compreendê-lo, não de forma ingênua. No fim, claro, o público exige uma punição, mas sem antes, claro, entender os reais motivos da trama que o levou a cometer estes atos, na maioria das vezes, imorais.


Em uma trama, desta vez no Senado Federal, Renan trai a esposa com uma jornalista, a bela Mônica Veloso, tem um filho, com a pensão paga mensalmente pelo lobista Cláudio Gontijo, da construtora Mendes Júnior. O pai zeloso também cuida do futuro do rebento, ao pôr R$ 100 mil na conta do garoto, o que chama de “bolsa de educação e cultura”. E depois de tudo, a esposa do senador alagoano assiste a tudo, digna do comportamento vitoriano de Hillarie Clinton, no caso Mônica Lewinski. E quando, os “amigos” começam a fugir, como os ratos no naufrágio, ele ameaça contar os podres de quem lhe virar as costas. Esta é uma história real, contada de forma fragmentada pelos jornais. Os fatos poderia, sem dúvida, serem melhor entremeados e explicados. O que ajudaria a opinião pública a contestar com maior veemência a permanência de Renan no Senado, condicionada atualmente pelo conluio de amizades que apostam no esquecimento da população.

Que as novelas, até como uma tentativa de sobrevivência, abusam da realidade, modificam o ponto de vista dos brasileiros, e ajudam a moldar o senso crítico, e a moral dos brasileiros, não há nenhuma dúvida. Tudo isto porque as novelas tentam acompanhar o ritmo da sociedade. Já o Jornalismo ainda trabalha com os antigos pressupostos de verdade, objetividade e parcialidade. E com o medo de transpor estes princípios, como um santo dentro de um convento, amendrotado com a punição de salvar a sua alma, não avança como deveria na cobertura dos acontecimentos.
A realidade dos noticiários deixou, há muito tempo, de ser a mesma dos brasileiros. Enquanto a ficção, de forma natural, leva a discussão para a sala dos brasileiros, o Jornalismo tenta, em vão, recorrer ao conservadorismo, para proteger os pobres e os oprimidos. Até os super-heróis, com os seus códigos de honra, precisam mudar. O que a ficção faz continuamente, a atualizar com base na realidade, e começa a suprir o que o público realmente está interessado: a verdade, com o contexto da realidade, e se não for pedir muito, com uma pitada de bom humor e sem o tom didático e professional.

Fotos: Olavo Novaes - Rede Globo; Renan Calheiros - Agência Brasil