quarta-feira, junho 27, 2007

A realidade das novelas

Na estratégia, bastante discutível, de entremear o noticiário do Jornal Nacional com as novelas, a TV Globo atrai não apenas públicos diversos, mas bagunça o que deveria ser, na teoria, claramente dividido. A ficção e a não-ficção entram, neste sentido, para dar um contexto verossímil do mundo, tão confuso quanto a rede de conexões que permeia a vida de qualquer mortal. As pessoas, no inconsciente, misturam as artimanhas do vilão Olavo Novaes (Wagner Moura), da novela Paraíso Tropical, com a não menos interessante rede de intrigas do senador Renan Calheiros, presidente do Senado Federal.

Em um ideal, que merece ser diagnóstico e delineado, a separação entre a ficção e a não-ficção parece cada vez menos importar a quem realmente interessa: o público. Esta é uma dualidade, em que a convivência apenas fortalece a troca de símbolos e que passa a representar de forma mais clara, e útil, as mudanças do mundo. Nem sempre os resultados da separação total das dualidades, assim como sonho e o pesadelo, verdade e mentira, bem e mal, caracterizam como um espectro interessante. Ao contrário, na maioria dos casos, falsifica o que deveria realçar, simplifica o que deveria contextualizar. Escondem-se as verdadeiras interligações entre fatos e sentimentos.

Na ficção Olavo fecha negócios escusos, molha a mão de um funcionário para vencer uma licitação, deixa funcionários sem condução, no meio de uma guerra civil na África, com o único intuito de reduzir os custos, confronta o bom mocismo do folhetim e se apaixona por uma prostituta. Estas cartas estão na mesa. Não há, no entanto, por parte do público a intenção de demonizá-lo, e sim, compreendê-lo, não de forma ingênua. No fim, claro, o público exige uma punição, mas sem antes, claro, entender os reais motivos da trama que o levou a cometer estes atos, na maioria das vezes, imorais.


Em uma trama, desta vez no Senado Federal, Renan trai a esposa com uma jornalista, a bela Mônica Veloso, tem um filho, com a pensão paga mensalmente pelo lobista Cláudio Gontijo, da construtora Mendes Júnior. O pai zeloso também cuida do futuro do rebento, ao pôr R$ 100 mil na conta do garoto, o que chama de “bolsa de educação e cultura”. E depois de tudo, a esposa do senador alagoano assiste a tudo, digna do comportamento vitoriano de Hillarie Clinton, no caso Mônica Lewinski. E quando, os “amigos” começam a fugir, como os ratos no naufrágio, ele ameaça contar os podres de quem lhe virar as costas. Esta é uma história real, contada de forma fragmentada pelos jornais. Os fatos poderia, sem dúvida, serem melhor entremeados e explicados. O que ajudaria a opinião pública a contestar com maior veemência a permanência de Renan no Senado, condicionada atualmente pelo conluio de amizades que apostam no esquecimento da população.

Que as novelas, até como uma tentativa de sobrevivência, abusam da realidade, modificam o ponto de vista dos brasileiros, e ajudam a moldar o senso crítico, e a moral dos brasileiros, não há nenhuma dúvida. Tudo isto porque as novelas tentam acompanhar o ritmo da sociedade. Já o Jornalismo ainda trabalha com os antigos pressupostos de verdade, objetividade e parcialidade. E com o medo de transpor estes princípios, como um santo dentro de um convento, amendrotado com a punição de salvar a sua alma, não avança como deveria na cobertura dos acontecimentos.
A realidade dos noticiários deixou, há muito tempo, de ser a mesma dos brasileiros. Enquanto a ficção, de forma natural, leva a discussão para a sala dos brasileiros, o Jornalismo tenta, em vão, recorrer ao conservadorismo, para proteger os pobres e os oprimidos. Até os super-heróis, com os seus códigos de honra, precisam mudar. O que a ficção faz continuamente, a atualizar com base na realidade, e começa a suprir o que o público realmente está interessado: a verdade, com o contexto da realidade, e se não for pedir muito, com uma pitada de bom humor e sem o tom didático e professional.

Fotos: Olavo Novaes - Rede Globo; Renan Calheiros - Agência Brasil


Um comentário:

Anônimo disse...

Novelas moldam negativamente a moral do brasileiro, colega.
Abra o olho e para de defender esse lixao.