Saem sempre desgovernados. Não respeitam sinais de trânsito, faixas de pedestres. Se existem carros na frente, estes logo sobem as calçadas e invadem os canteiros quando as sirenes dos carros de bombeiros estão de passagem. Pela conveniência, hoje resolveram sair em filas. De forma ordenada, como em um sete de setembro convencional,pediam licença para passar, com a educação de uma senhora de 80 anos na hora do "rush". Do quartel, localizado na rua 66, no Setor Central, em Goiânia, os oficiais dirigiam-se para o Emílio Povoa, bairro carente ao lado da Goiás Norte, também no Centro.
Na frente, atrás, no meio, ou onde pudessem entrar, a imprensa desbaratinada seguia o pelotão. Nos rostos por onde a trupe passava, só a dúvida. Mas este também era a minha. Afinal, para quê tudo isto?!
O leitor do referido blog também deve estar um pouco confuso, não é? Explico. O Corpo de Bombeiros juntamente com a Liquigás (empresa ligada à estatal Petrobrás) resolveu distribuir botijões de gás e o equipamento, como mangueira, braçadeira e a válvula. A campanha pretende evitar incêndios com escapamento de gás. Para a minha surpresa, 90% dos incêndios em pequenas residências nas periferias são causados pela falta de manutenção do equipamento, que deve ser trocado a cada três anos. O objetivo da campanha procedia. Tanto que na segunda casa visitada, até cheiro de gás havia. (Ler matéria)
Voltando à história. A população do Emílio Povoa devia pensar, no mínimo, que ali se realizava uma operação policial. Afinal, carros de bombeiros e jornalistas só vão nestes lugares quando tem desgraça (É uma preconceito meu em relação à imprensa, mas deve haver as suas exceções) As pessoas saiam nas portas. Pareciam até estarem com medo. De forma sincronizada, assim como nas séries policiais de TV, os bombeiros saiam dos seus carros, enquanto jornalistas corriam atrás da notícia. Considerando-se uma série policial tupiniquim, bombeiros e jornalistas não sabiam para onde deveriam ir.
A paralisação se deu por uns quatro minutos. Até quando um jornalista do Diário da Manhã (DM) informa: “Calma gente, não é desgraça não. É coisa boa. Eles estão trocando o equipamento de gás e...”. Foi oportuno ele ressaltar isso. Nisto uma aglomeração de pessoas adentrou a casa da senhora. Câmaras, máquinas fotográficas, microfones, gravadores e muita pressa, além do corpo de bombeiros. Os bombeiros mirins, que deveriam ajudar nas orientações aos populares, (assim dizia o projeto assinado em menos de uma hora) não sabiam o que fazer. "Ao menos desta vez ela vai ganhar um botijão. È R$ 33 a menos na conta do fim do mês", pensava eu, um pouco passado com a velocidade que tudo se processava.
“Cadê a assessoria? Gritava uma jornalista da TV Anhanguera, esta aflita, porque o material deveria entrar no jornal do meio dia. Já passava das 10h40. Naquela hora, não tinha assessoria que ajudasse. Ainda por cima, dois jornalistas retardatários ainda faziam entrevistas, com os bombeiros chefes. Esperava pacientemente, já que deveria entregas a matéria só no fim do dia. Estas eram as minhas metas. Já que tinha tempo até sexta feira, dia do fechamento. A repórter continuava, desta vez a berrar. “Eu não quero entrevistar mais ninguém. Já entrevistei todo o mundo”. Verdade, a imprensa pontual chegou às 09h00. Eu cheguei às 09h30. Havíamos até tomado café. O bolo estava gostoso. Depois do café da mesa, uma cerimônia de assinatura do contrato demorou mais meia hora.
Parei, olhei, e pensei. “Aquela casa já está dominada”. Vamos para a próxima. A partir daí, deixei a minha pseudo-ética de lado. Já havia conversado com a dona da casa. Enquanto isto, outra repórter, esta da TBC fazia a passagem. "Com este acordo,botijão de gáis... Gaís?! Gaís não. É gás", corrigia-se a moça. Mas só quando os bombeiros chegaram, resolvemos entrar. Como de praxe, primeiro ciengrafistas e fotógrafos, repórteres de TV e depois, se puder, a impressa escrita. O fedor de gás alastrava-se por toda a casa. “Gente, tá fedendo gás”. Realmente estava. Todos sentiam. "Cuidado para não explodir. Daqui a pouco, nós que seremos notícias se esse barraco explodir", falou a repórter na frente da dona da casa aos risos. Deixei a minha indignação de lado, e invadi como todo o mundo a casa da senhora. Ela estava preocupada com a arrumação. Falei para despreocupar, ela não havia sido informada desta invasão.
Fiquei atrás, enquanto dois bombeiros, inclusive mais quatro bombeiros mirins ficavam na cozinha. A situação aí só piorou. A encenação era geral. A casa, composta pela sala pequena sala para onde iam a cozinha. De lá, só os fundos, já quase toda desabada. "Não durava mais dois verões, até cair o restante, e a casa ser interditada pela Defesa Civil", comentei com o bombeiro mirim, o qual eu entrevistei. A dona da casa procurava desesperada uma chave de fenda, para que o bombeiro pudesse enroscar a válvula na mangueira de gás, que foi trocada. E a repórter, apressada, dava broncas pela demora. "Desculpa gente, mas o material precisa entrar no jornal do meio-dia".
Está bem, ninguém sobreviveria se a reportagem não passasse no meio-dia. Ela, para apressar o serviço, queria que usassem uma linguagem não tão técnica. Sobrou até para a dona da casa, que foi obrigada a confessar a negligência. Serviço feito, a repórter sai. Sobra um pouco de espaço. Uma olhada em volta da casa, só sobrou eu. Até que eu não precisei perguntar muito. Logo, a moradora já dizia abertamente o porque não tinha trocado a válvula quando sentiu o cheiro de gás pela casa. “Pensei que fosse o gás”. Ta certo. Ouvi o rapaz do corpo de bombeiros. Ouvi as explicações técnicas acerca do problema. Acho que está bom. Despedi-me.
Deixei a casa. Só tinha eu da dita "Imprensa". Todos foram embora. O papel da imprensa (eu incluído) já estava cumprido. Alguns bombeiros não viam a hora de irem para casa. Enquanto alguns bombeiros mirins precisavam voltar às suas casas. Tinham que ir à escola no período da tarde. Entro no carro, já despreocupado. Na saída, uma equipe do corpo de bombeiros continuava a fazer a vistoria no restante das casas.
Trilha: Emílio Póvoa, região central de Goiânia
domingo, novembro 19, 2006
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