quarta-feira, agosto 16, 2006

Ritos de Passagem

As nuvens cobriam grande parte do centro da cidade. O clima abafado obriga os pássaros se locomoverem rapidamente. Ao passarem pela cruz, situada no alto da Catedral São João Batista, os sinos já badalavam em um ritmo forte, sem nenhuma parada ou alternância. Os passos das pessoas que acompanhavam o cortejo traduziam a pressa da última viagem. Os degraus eram os últimos desafios, sempre respaldados por quatro mãos, que carregavam de forma cautelosa o caixão.

O silêncio rompido pela entrada torrencial trouxe à igreja um ar pesado. Junto de familiares e amigos, entrava Edgard de Freitas Regis (1920-2006). Parou no centro, entre o altar e as cadeiras. Jesus Cristo crucificado em cima, o seu corpo embalsamado no meio, e a união de todos em prol de um único sentimento: o pesar. Não houve tempo de lutar contra o câncer, que deixara o pulmão, passara pelo baço, fígado e rins. As dores das duas últimas semanas reforçaram o seu heroísmo diante da vida, lembrado nas conversas consoladoras entre os parentes.

As orações e canções misturavam-se aos choros contidos, às lágrimas insistentes, rostos cabisbaixos e um certo caráter de reprovação contra o inevitável. “Edgar era um homem alegre, gostava de muita alegria, desta forma deve ser lembrado”, recordavam durante a missa. Difícil era a alegria em um momento como aquele, mesmo para um dono de um bar, sempre rodeado de alegres amigos, unidos pelo copo de cerveja, música ao vivo emitida pelo som do seu violão. A música composta para o próprio enterro não ecoava na catedral, mas sim as melancólicas e uniformizadas badaladas dos sinos da São João Batista.

Trilha: Entrada da Catedral São João Batista, juntamente com as saudades do tempo perdido

2 comentários:

Ana disse...

O tempo nunca é o suficiente para tudo que desejamos fazer. As pessoas mais velhas são um claro exemplo, eles ficam sempre tão pouco tempo conosco que para nós, hoje, jovens a saudade e ensinamentos são os melhores sabores que o tempo podem nos deixar.

O amor é eterno, o retorno sempre prova isso... esses amores ficam eternizados com cada membro da família. Pode procurar que você o encontra em algum centimetro do seu corpo.

Ana disse...

Beijos ...